Quando falamos em Inteligência Artificial (IA) é quase impossível não vir à memória a famosa obra de Isaac Azimov, Eu Robot. Lembramo-nos instantaneamente das 3 leis e da preocupação com a continuidade da vida humana depois das máquinas ganharem total controlo sobre a Terra. A ficção funde-se com a realidade e isso faz-nos temer o futuro. A incerteza causada pela volatilidade do mundo de hoje e a velocidade com que a tecnologia evoluiu nos últimos 50 anos, impede-nos de querer evoluir e aceitar a disrupção. 2023 tem sido apontado como “o ano da Inteligência Artificial”, por isso, é mais do que pertinente pensar nos vários setores de atividade em Portugal e na forma como podem ser afetados pelas novas ferramentas de IA que invadem as nossas vidas. A Educação não fica indiferente.

A Importância da Ética no Uso da Tecnologia

Todas estas questões, levantadas pelo tema da IA, conduzem as conclusões para um princípio que muitos exigem, mas nem todos o praticam: a Ética. A origem do conceito tem milhares de anos, vindo da palavra grega Ethos, uma forma usual de agir e ser – o caráter. Uns séculos mais tarde, na filosofia clássica, a Ética já era considerada algo mais do que a padronização dos hábitos e formas de estar e agir, passando a definir a melhor forma, não só de viver a vida privada, mas também de conviver com outros, em sociedade. Deu origem a faculdades como a antropologia, a sociologia, a psicologia, a economia, a pedagogia e a política. No fundo, engloba tudo o que diz respeito à convivência entre humanos. Estes conceitos definem a vontade de formar sociedades estruturadas, seguras, saudáveis e em harmonia.

Esta harmonia tolerante é, precisamente, o que procuramos quando algo disruptivo acontece e ameaça o bem-estar de todos, os chamados wild cards. Trata-se de uma forma moral de manter o controlo das massas. O surgimento da IA pode ser uma dessas ameaças e, por isso, muito se tem falado em Ética quando se coloca em cima da mesa hipóteses como: a Inteligência Artificial vai acabar com os nossos empregos, vai tornar os nossos filhos dependentes, sedentários, preguiçosos e antissociais, vai destruir as gerações futuras e tudo o que construímos até então. O ser humano é uma criatura de hábitos, portanto, tudo o que venha mudar a vida tal qual a conhecemos, é uma ameaça e causa desconforto.

Os Desafios e as Oportunidades para a Educação

Um dos temas mais falados este ano é o uso massificado de plataformas como o ChatGPT, uma ferramenta que tem preocupado muitos docentes e pais. Os alunos podem gerar respostas e até trabalhos mais extensos, recorrendo à Inteligência Artificial, em segundos. Este fenómeno levanta vários problemas e um deles obriga-nos a repensar, entre outras coisas, os processos de avaliação.

Para a UNESCO, a visão é, globalmente, mais otimista, uma vez que “a IA tem o potencial de responder a alguns dos maiores desafios da Educação de hoje”. A organização criou um documento de referência para que os legisladores de vários países implementem uma abordagem à IA centrada no humano, destacando a importância desta tecnologia no “acesso ao conhecimento, investigação, e à diversidade de expressões culturais” e assegurando que “não vai aumentar as divisões entre e no seio dos países”.

A aprendizagem personalizada é uma das vantagens que a IA pode trazer, segundo os especialistas, bem como a automatização de tarefas administrativas e a possibilidade de garantia de um serviço de mentoria fora da sala de aula e sempre que o aluno precisar. A Comissão Europeia publicou um conjunto de boas-práticas para professores, tendo em conta o “uso da Ética da IA”. Em suma, esta tecnologia é vista por alguns especialistas mais otimistas como uma oportunidade de fazer a Educação evoluir num bom sentido e transformar a educação e a formação. Tem um enorme potencial para ajudar professores a alcançar a aprendizagem individualizada e personalizada. Todavia, há também pensadores e personalidades conhecidas do público que expressam as suas preocupações publicamente sobre o uso massificado da IA, como o historiador e autor best-seller Yuval Harari, num artigo do The New York Times. Harari descreve o seu receio de que a IA se torne “no sistema operacional da cultura humana”.

O Equilíbrio entre a Vida Digital e a Física: como Regular o uso de IA no Ensino

Há quem defenda que, no caso de os alunos usarem a IA para fazer os trabalhos por si, é sempre possível desenhar um sistema de avaliação que contrarie esse comportamento. No limite, se a avaliação não impedir os trapaceiros, quando esses se formarem e tentarem entrar no mercado de trabalho, não estarão preparados para os desafios e terão muita dificuldade em conseguir emprego ou manter um por muito tempo. Por outro lado, os alunos que usem a IA para melhorar as suas capacidades, terão mais vantagens quando enfrentarem os seus desafios profissionais e estarão mais bem preparados. A tecnologia está a gerar preocupações sobre como mensurar a aprendizagem e o risco de desinformação, devido a esta falta de controlo sobre como o aluno compôs o seu trabalho e porque as fontes de informação (bases de dados) dos algoritmos são desconhecidas e dúbias.

Já houve essa preocupação nos EUA recentemente, resultando em mudanças de formato de avaliação de alguns cursos superiores, que passaram a incluir mais provas orais, mais trabalhos de grupo, testes/trabalhos manuscritos em vez de impressos, entre outros métodos. O efeito que o avanço repentino da IA está a ter na Educação está a fazer com que alguns docentes estejam a regredir no uso de tecnologia em sala de aula. A própria UNESCO, apesar de se mostrar otimista quanto às potencialidades das novas tecnologias para a Educação, tem em curso um processo de proibição do uso de telemóvel nas escolas e apresentou resultados com impacto negativo no aproveitamento de alunos que estão excessivamente expostos a estes dispositivos.

Os educadores estão preocupados com o equilíbrio de tempo que os mais novos passam em frente a ecrãs, versus o tempo de convivência com os seus amigos e familiares, em espaços ao ar livre e outras atividades no mundo físico. Na Europa são 6 os países que já proíbem o uso de telemóveis nas escolas. O governo francês já aplicou medidas em 2018, os Países Baixos preveem essa restrição a partir do próximo ano e um agrupamento de escolas português avançou com a proibição desses dispositivos nas escolas do 1.º ciclo, já a partir do corrente ano letivo.

Como o uso da IA e outras tecnologias sem controlo parental ou escolar é ainda recente, não há legislação para regular a sua aplicação em muitos setores. Algumas regras vão sendo implementadas ao longo do tempo, para controlar possíveis desvios do comportamento das massas, face à usabilidade da tecnologia no dia a dia.

Como Incorporar a Inteligência Artificial no Ensino

A Educação está a enfrentar, a nível global, três principais desafios:

  • Oferecer uma educação de qualidade, que prepare os jovens para os desafios do futuro;
  • Assegurar que a educação é acessível a todo o tipo de estudantes, incluindo comunidades rurais, ou crianças e jovens com dificuldades mentais ou motoras;
  • Reduzir os custos da educação para instituições e famílias.

Um dos problemas que afeta a qualidade do ensino – o primeiro desafio apresentado – é o facto dos professores estarem enterrados em tarefas administrativas que retiram tempo para a parte pedagógica do ensino, parte essa que deveria, em teoria, ser a mais importante e com a maior fatia do tempo de trabalho. Tudo isto leva a que os sistemas de ensino se tornem ineficientes.

Como pode, afinal, a IA ser incorporada no sistema de ensino e responder aos desafios atuais do setor?

O seguinte gráfico exemplifica, de forma simples, as soluções que a IA pode trazer para combater esses problemas:

Ensinar na Era da Inteligência Artificial

Problemas e Soluções de IA

Fonte do gráfico: https://www.schooleducationgateway.eu/

Para implementar a IA no currículo, terá de ser feita uma adaptação das metodologias de ensino para desenvolver capacidades fundamentais à aprendizagem desta tecnologia. Embora o foco do desenvolvimento das ferramentas de IA esteja na indústria e nas empresas, já existem várias ferramentas de IA disponíveis para professores que queiram incluí-la no plano de estudos. Alguns exemplos de ferramentas que podem ser usadas nas aulas de educação STEAM são os seguintes:

  • PhotoMath
  • Seek by iNaturalist
  • Verse by Verse
  • Duolingo
  • Newspaper Navigator
  • MuseNet
  • Socratic
  • Brainly

Os alunos precisam de adquirir as competências para a vida e o trabalho num mundo moldado pela IA, por isso, desenvolver o pensamento computacional, a resolução de problemas, programação, análise de dados e automação é fundamental para preparar o seu futuro.

Dadas as claras vantagens da adoção da IA ​​na educação, o ideal seria concentrar o investimento e o esforço inicial em dois conceitos importantes – aprendizagem personalizada e classificação/avaliação. Estes dois conceitos, por si só, trazem benefícios significativos para responder aos desafios supra identificados, como a melhoria da aprendizagem dos alunos e a redução da carga administrativa dos professores, que passariam a ter mais tempo para a parte pedagógica.

Para acelerar o ritmo da mudança, as instituições educativas devem estabelecer parcerias com fornecedores de tecnologia, para desenvolver soluções que se adaptem às suas circunstâncias individuais, que melhor sirvam os seus alunos e funcionários e mantenham o contacto para garantir a melhoria contínua dos parques de equipamentos.

É claro que as instituições de ensino também são livres de não adotar a tecnologia de IA de forma alguma, no entanto, isso pode apresentar algumas desvantagens a longo prazo. O ambiente universitário é extremamente competitivo, como todos sabemos. Aqueles que optarem por não integrar IA nos seus planos de estudos, provavelmente ficarão atrás da concorrência, resultando em menos matrículas e receita. Nos ensinos preparatório e secundário, não adotar soluções de Inteligência Artificial significa que a educação ficará restrita a uma abordagem de um para muitos, com grandes encargos administrativos para o pessoal e poucas oportunidades de oferecer ensino de qualidade aos alunos. No fundo, não poderão preparar tão bem os seus jovens para o futuro.

A BCN ajuda escolas por todo o país a conhecer as suas próprias potencialidades e a abrir as portas ao futuro da educação. Se é educador e pretende melhorar a experiência de aprendizagem dos seus alunos, não hesite em falar com a nossa equipa para tirar todas as dúvidas sobre educação STEAM.